30 de nov. de 2016

Câmara desfigura pacote anticorrupção e inclui punição a juízes

Redação Portal Cleriston Silva PCS

Depois de mais de sete horas de sessão, os deputados desfiguraram o pacote que reúne um conjunto de medidas de combate à corrupção propostas pelo Ministério Público Federal e avalizadas por mais de 2 milhões de assinaturas de cidadãos encaminhadas ao Congresso Nacional. O texto foi aprovado pela Câmara na madrugada desta quarta-feira (30). Com a aprovação, o projeto segue agora para análise do Senado.

Ao longo da madrugada, os deputados aprovaram diversas modificações no texto que saiu da comissão especial. Diversas propostas foram rejeitadas e outros temas polêmicos foram incluídos. Das dez medidas originais, somente quatro passaram, ainda assim parcialmente.

O texto original do pacote anticorrupção tinha dez medidas e foi apresentado pelo Ministério Público Federal . Na comissão especial da Câmara que analisou o tema, uma parte das sugestões dos procuradores da República foi desmembrada e outras, incorporadas ao parecer do relator Onyx Lorenzoni (DEM-RS). As discussões foram acompanhadas pelo Ministério Público, que deu o seu aval ao texto construído.

Segundo o relator, do texto original, só permaneceram as medidas de transparência a serem adotadas por tribunais, a criminalização do caixa 2, o agravamento de penas para corrupção e a limitação do uso de recursos com o fim de atrasar processos.

'Sede de vingança' - Após a sessão, o deputado Onyx Lorenzoni lamentou o resultado e disse que os parlamentares agiram movidos "por sede de vingança" contra o Ministério Público e o Judiciário. Para ele, houve uma "desconfiguração completa do relatório".

"O parecer não era meu, era da sociedade brasileira que tinha depositado as suas esperanças na Câmara dos Deputados. Lamentavelmente, o que a gente viu aqui foi uma desconfiguração completa do relatório, ficando de pé, objetivamente, apenas as medidas de estatísticas e a criminalização do caixa 2", afirmou Lorenzoni.

"E trouxeram essa famigerada situação de ameaça, de cala-boca, de agressão ao trabalho dos investigadores brasileiros. Creio que a Câmara perdeu a chance de prestar um serviço ao Brasil. E, movidos por uma sede de vingança contra o MP e contra o Judiciário, acho que começaram uma crise institucional que deve se agravar nos próximos meses", disse Lorenzoni.

Abuso de autoridade - Além de retirarem diversas propostas, os deputados incluíram no projeto a proposta de punição de juízes e membros do Ministério Público por abuso de autoridade.

Essa previsão havia sido incluída pelo relator do texto, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), mas retirada pelo próprio relator posteriormente.

A emenda foi apresentada pela bancada do PDT e lista as situações em que juízes e promotores poderão ser processados, com pena de seis meses a dois anos de reclusão. A legislação atual já prevê o crime de abuso de autoridade, mas é mais genérica.

Entre as condutas que passariam a ser crime estariam a atuação dos magistrados com motivação político-partidária e a apresentação pelo MP de ação de improbidade administrativa contra agente público "de maneira temerária". Nesse caso, além de prisão, os promotores também estariam sujeitos a indenizar o denunciado por danos materiais e morais ou à imagem que tiver provocado.

A Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) reagiu na manhã desta quinta-feira, 30, ao pacote aprovado pela Câmara. "Enfraquecer a Magistratura criando crimes pela atividade cotidiana dos juízes é favorecer a prática da corrupção”, afirmou o presidente da Ajufe, Roberto Veloso.

O procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato no Paraná, também fez críticas na noite da quarta-feira: “Está sendo aprovada a lei da intimidação contra promotores, juízes e grandes investigações”, disse no Twitter.

Os dois temas incluídos no pacote durante a votação no plenário foram a previsão do crime de abuso de autoridade para juízes, desembargadores e membros do Ministério Público e a punição a policiais, magistrados e integrantes do MP que violarem o direito ou prerrogativa de advogados. O abuso foi aprovado por meio de emenda apresentada pela bancada do PDT. Já a punição para violação de prerrogativas foi proposta pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS), a pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

CONFIRA AS MUDANÇAS APROVADAS NO PLENÁRIO:

Abuso de autoridade: Inclusão do crime de abuso de autoridades para magistrados e membros do MP - emenda apresentada pela bancada do PDT.

Pena: 6 meses a 2 anos de reclusão e multa.

Punição para violação de prerrogativas: Inclusão de punição a policiais, juízes e membros do MP que violarem direito ou prerrogativa de advogados - emenda apresentada pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS), a pedido da OAB.

Pena: 1 a 2 anos de detenção e multa.

Reportante do bem: Retirada a instituição do "reportante do bem": figura cuja denúncia a órgãos da Justiça ou à imprensa acarretasse imposição de penalidades poderia receber até 20% dos valores recuperados - destaque apresentado pela bancada do PSB.

Ação de extinção de domínio: Retirado todo o trecho que regulava a apresentação das chamadas "ação de extinção de domínio", cuja finalidade é decretar a extinção dos direitos de propriedade e posse e de outros direitos - destaque apresentado pela bancada do PR.

Progressão de pena: Retirado artigo que previa que condenado por crime contra administração pública só teria direito a progressão do regime de cumprimento de pena quando reparasse o dano causado ou devolvesse os recursos produtos do ato ilícito praticado - destaque apresentado pela bancada do PT.

Prescrição da pena: Retirados quatro artigos que endureciam as regras de prescrição de crimes, como a que estabelecia que o prazo de transcrição só começaria a ser contado após o ressarcimento integral do dano - emenda apresentada pela bancada do PT.

Enriquecimento ilícito: Retirado tipificação do crime de enriquecimento ilícito para funcionários públicos - destaque apresentado pelo bloco PP, PTB e PSC.

Acordo penal: Retirada possibilidade de Ministério Público e denunciado celebrarem acordo para aplicação imediata da pena antes da sentença judicial - destaque apresentado pela bancada do PSOL.

Acordo de leniência: Retirado trecho que previa que Ministério Público poderia celebrar acordo de leniência - destaque apresentado pela bancada do PT.

Responsabilização de partidos: Retirada da previsão de pena de suspensão do funcionamento dos partidos e da filiação do dirigente partidário responsável por crime de caixa 2 - destaque apresentado pelo bloco PP, PTB e PSC

Lei dos Partidos: Retirada de trecho que revogava artigo da Lei dos Partidos que estabelece que a responsabilização pessoal, civil e criminal de dirigentes partidários em razão da desaprovação de contas e atos ilícitos atribuídos ao partido só ocorre se a Justiça verificar irregularidade "grave e insanável". Dessa forma, o artigo permanecerá na Lei dos Partidos - destaque apresentado pela bancada do PR.

MUDANÇAS QUE TINHAM SIDO APROVADAS NA COMISSÃO

Caixa 2: Inclui punição a quem praticar caixa 2 em nome do candidato ou do partido, como tesoureiros de campanha ou das legendas;

- Reduziu multa a partidos para de 5% a 20% do valor de repasse da cota do fundo partidário referente ao ano em que o ato lesivo ocorreu. MPF queria multa de 10% a 40%.

- Em caso de agravante, pena de 2 a 5 anos para caixa 2 será elevada em um terço, e não mais dobrada, como previsto.

Venda de voto: Tornou mais explícito que o eleitor que vender o voto também será responsabilizado, com pena de um a quatro anos.

Reportante do bem: Criou a figura do reportante: figura cuja denúncia a órgãos da Justiça ou à imprensa acarretar imposição de penalidades, poderá receber até 20% dos valores recuperados.

Crime de corrupção: Torna crime hediondo crimes de corrupção contra administração pública apenas quando o valor da vantagem for superior a 10 mil salários mínimos. Parecer anterior mencionava 100 salários mínimos.

Embargos declaratórios: Embargos declaratórios só poderão ser apresentados uma única vez e deverão ser respondido em um prazo de até 5 dias pela Justiça.

Ação Popular: Reincorporou normas para atualização da Lei da Ação Popular.

Prova ilícita: Deixa claro que provas ilícitas não poderão ser aceitas em processo.

Habeas Corpus: Retirou medidas que restringiam a concessão de habeas corpus; manteve apenas trecho que diz que juiz deverá "cientificar" MP e defesa para se manifestar sobre habeas corpus, caso instrumento tenha efeitos na investigação criminal ou processo penal.

Teste de integridade: Retirado por destaque apresentado pelo PT.

Prisão preventiva: Rejeitada proposta que permitia prisão preventiva com finalidade de permitir identificação, localização e devolução do produto do crime.

Cooperação internacional: Retirou artigos que regulavam cooperação jurídica internacional entre a Justiça brasileira e de outros países.

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