22 de jul. de 2012

Moradores de seis bairros em Alagoinhas reclamam da falta de água

Redação Portal Clériston Silva PCS 

Pelas mãos de Maria de Lourdes Passos, 67 anos, passaram as roupas das famílias mais distintas de Alagoinhas, localizada a 107 quilômetros de Salvador. Calças, camisas, lençóis lavados ao longo dos anos com a mesma água que usa para o consumo.

A água limpa, pura e de qualidade que brota no solo de Alagoinhas - localizada no aquífero de São Sebastião, área que possui 7% de toda água do Recôncavo Baiano - atrai várias indústrias de bebidas para a cidade. Na última semana, o grupo Petrópolis, fabricante da cerveja Itaipava, anunciou sua ida para a cidade que já tem uma fábrica da Schincariol e receberá também a Indústria São Miguel (ISM). Há pretensões da ida da Coca-Cola e do grupo Tropical para a cidade.

O segredo está no solo arenoso, que faz uma espécie de filtragem e purifica a água.

A abundância e a qualidade do recurso natural para as empresas de bebidas, porém, não é a mesma para a população. Moradores de pelo menos seis bairros visitados pelo CORREIO (Barreiro, Alecrim, Santa Terezinha, Alto do Santo Antônio, Alagoinhas Velha e Jardim Petrolar) relatam constantes interrupções no fornecimento na cidade.

“Pago minha conta todo mês, mas todo final de semana falta água aqui. Tenho que juntar os baldes, vasilhas para colocar a água, porque sempre falta”, reclama a lavadeira Maria de Lourdes, que mora no bairro Santa Terezinha e paga, em média, R$ 45 por mês.

O segurança Artur Santos Lima também tem que dar um jeito. “Tenho que encher as garrafas, porque não tem água aqui, não. A água é muito boa, mas não chega para a gente”, diz ele, que mora no Alto do Santo Antônio.

Moradora do mesmo bairro, Eliete Bispo Silva Santos reclama da falta de manutenção. “As fábricas gastam muita água e falta pra nossas casas. Quando quebra algum cano ou alguma coisa é um caos. Demora muito para consertar e a gente fica sem água”.

Abundância - As indústrias de bebida, por outro lado, não se queixam de nada. Pelo contrário. O gerente geral da Indústria São Miguel, Guilherme Soares, empresa que investiu R$ 50 milhões na criação de fábrica em Alagoinhas para produzir bebidas, indica que a renovação do aquífero de São Sebastião favorece a área como polo industrial. “Há uma alimentação constante, sem riscos de desabastecimento a longo prazo”, diz. 

O diretor de Relações Institucionais da Schincariol, José Francischinelli, reforça: “A quantidade e a qualidade da água foram alguns dos principais motivos pelos quais a Schincariol instalou a fábrica no local”, explica.

E a própria prefeitura reconhece que água é o que não falta. “Projetando o acréscimo de consumo atual, com o advento de novas indústrias – fábrica de refrigerantes São Miguel, cervejaria Itaipava, duplicação da Schincariol e o aumento natural de consumo doméstico -, seguramente não chegará ainda a 25% da potencialidade do sistema aquífero do município”, diz a administração municipal, em nota.

Então, por que falta água para a população desses bairros enquanto as indústrias não têm problemas?

Em primeiro lugar, segundo a prefeitura, as indústrias têm seus próprios sistemas de captação e abastecimento de água, independentes do sistema municipal - o que lhes dá autonomia e garante o abastecimento constante. Por outro lado, o Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Alagoinhas (Saae), responsável pelo abastecimento da cidade, usa uma rede envelhecida.

“O sistema é velho e quando tem algum problema demora para resolver”, reconhece Nilo Carvalho, representante do Saae. Seriam necessários produzidos 24 milhões de litros de água em duas estações - Sobocó e Cavadas - que fornecem água para 44 mil ligações residenciais atendendo 142 mil habitantes. “Os problemas de abastecimento só acontecem em 2% das residências onde as pessoas não possuem tanques e reservatórios”, afirma Carvalho.

Produção - Sobre as críticas da população, o diretor de Relações Institucionais da Schincariol destaca que a empresa está atuando com regularidade. “Esta é uma questão que está sendo trabalhada pela prefeitura de Alagoinhas e que não tem nenhuma relação com a fábrica da Schincariol”. Segundo ele, as empresas utilizam, em média, até 4 litros de água para produzir um litro de bebida - veja gráfico.

O gerente geral da ISM, Guilherme Soares, explica que a fábrica usará 1 milhão de litros de água por dia quando estiver totalmente instalada na cidade, que deve ser em até 2 anos. A extração da água da ISM será feita através de poço artesiano que tem profundidade de 230 metros com capacidade de extrair do solo 60 mil litros de água por hora. A Itaipava, que instalará fábrica na cidade, não respondeu ao CORREIO.

Dois rios abastecem aquífero que alimenta município - No município de Alagoinhas, o Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema) faz o monitoramento dos rios Catu e Sauipe, que alimentam as águas do aquífero de São Sebastião. Os dois têm características apontadas como próprias para o consumo. A água que abastece Alagoinhas é considerada de qualidade, pois surge de uma formação geológica privilegiada. É o que aponta estudo conduzido pelo professor Sérgio Augusto de Morais Nascimento, geólogo e mestre em Geociências, em 2003.

“O ambiente geológico do município de Alagoinhas apresenta um potencial hidrogeológico que se caracteriza como um dos melhores da Bahia, tanto em quantidade quanto em qualidade”, afirma o professor no relatório do estudo.

A professora Iraci Gama, formada em Letras e especialista na história de Alagoinhas, conta que o nome da cidade está ligado à água. No século 17, operários que trabalhavam na construção de igrejas e estradas se referiam às “lagoinhas” que brotavam do chão quando se perfurava o solo. Tropeiros, anos depois, chamavam a cidade de “Terra das Lagoinhas”. “É importante conhecer a história para valorizar a terra”, diz Iraci.

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